Estreia no blog do Doutor Poizé uma
nova coluna, Tubos de Ensaio, onde o seu médico preferido irá tratar de maneira
mais livre sobre temas variados. Hoje, a consulta é sobre o mercado de
quadrinhos no Brasil. Ele existe? Se sim, o que fazer com ele? Quais as expectativas?
Não precisa pegar guia nem marcar horário, é só chegar.
Não precisa pegar guia nem marcar horário, é só chegar.
Apesar das montanhas de dinheiro que os comics de super heróis proporcionaram à tantos empresários por todo
o século XX (e XXI), existiram muitos períodos de “vacas magras” no mercado de
quadrinhos dos Estados Unidos. Demissões massivas (que, as vezes, alcançavam
40% do departamento), vendas que oscilavam entre milhões de exemplares entre um
mês e outro, mais da metade das lojas de HQs quebrando no intervalo de um
semestre (todas essas informações podem ser conferidas detalhadamente em livros
como A História Secreta da Marvel Comics).
Isso não é privilégio específico da indústria de quadrinhos.
Contudo, estamos falando do que talvez seja o mais rentável mercado de HQs do
mundo (falo aqui de orelhada, pois não comparei com os números de mercados como
o japonês, por exemplo – onde revistas tipo Shonen
Jump já venderam mais que o New York
Times).
Todas essas indagações me levaram a pensar sobre o
incipiente mercado de quadrinhos no Brasil – que talvez poderíamos chamar mais
de “cena” que de “mercado”. Por mais que tenhamos evoluído em diversos aspectos
da escala da produção e distribuição das revistas (passando pelo acabamento
gráfico, o investimento de editoras em artistas nacionais, até o crescimento de
profissionais publicando trabalhos), acredito que estamos ainda muito longe de
consolidar uma indústria rentável e autossuficiente.
A grande maioria daqueles que trabalham com quadrinhos ainda
não conseguem sobreviver dessa atividade. Ainda são poucas editoras investindo
no gênero. Temos poucos roteiristas, e quase sempre os desenhistas é quem
escrevem suas histórias. Existem poucas séries em andamento. Estes são alguns exemplos
de questões que afligem nosso precário mercado de HQs brazuca.
E o caso Maurício de Souza? Bem, reza a lenda que ele vive
mais do merchandising e licenciamento
dos personagens do que dos gibis (se for verdade, não sei se essa premissa está
atualizada, dado o fato de que sua linha da Turma
da Mônica Jovem vendeu bastante, sem contar as Graphics MSP). De todo modo, o caso do criador da Mônica é mais
exceção que regra por aqui.
A meu ver, um investimento maciço na produção nacional deveria
ter sido feito há muito tempo. Isso talvez não teria apenas tirado o mercado de
quadrinhos brasileiro do caminho da estagnação, como poderia ter criado no país
uma cultura de se ler e consumir gibis, um hábito que seria passado de geração
para geração, como acontece em diversos países. Isso poderia ter sido feito há
algumas décadas, quando as vendas de HQs por aqui alcançavam cifras bem altas,
na casa das centenas de milhares. Contudo, a maioria dos autores – a despeito
de serem talentos notáveis, como Watson Portela ou Júlio Shimamoto – publicava como
podiam, com um apreço editorial que muitas vezes ficava bem aquém da grande
qualidade do trabalho.
Quando uma mídia deixa de fazer parte das experiências
comuns de uma sociedade, torna-se bem complicado depois cativar um público para
consumi-la. Eu particularmente fiquei muito chocado em dada ocasião, quando
mostrei a um amigo certa HQ que tinha acabado de publicar. Ao folhear a
revista, ele (que é mestre em letras, e atualmente é doutorando), me questionou:
“mas como funciona, lê-se assim mesmo, da esquerda pra direita”?
Não sei se esse amigo estava querendo bancar o dramático,
mas episódios como esse, em um grau menor de desinformação talvez, acontecem
vez ou outra. E não me refiro só a desententimentos como “o Superman é da
Marvel ou da DC?”, e sim questões relativas à mídia dos quadrinhos. Algo mais
próximo da famigerada questão: “quadrinhos são coisa pra criança?”.
Enfim, não sei se assumi o tom certo com esse ensaio, que
pode parecer um lamento sobre as chances desperdiçadas para se sedimentar um
verdadeiro mercado de quadrinhos no Brasil. A meu ver, com boa vontade dos
editores, isso poderia sim ter sido feito, ter fomentado carreiras, criado
gerações de leitores e autores, e um hábito de consumo de HQs.
Contudo, otimista que sou, acho que, mesmo tardiamente, é
possível investir nessa ideia. E temos dado passos largos nesse sentido. Na
verdade, diante de tantos autores publicando trabalhos de altíssimo nível, arrisco
dizer que possivelmente nunca demos tantos passos nesse sentido. Mas isso é
assunto para outro post.
Bom Dia Dr.!!!(Me senti numa consulta, isso foi esquisito, kkk)
ResponderExcluirVi seu texto no blog Ponto Zero e o que mais me chamou a atenção foi sua reflexão.
Eu e mais dois amigos temos um projeto de escrever uma HQ, mas nada nos padrões Brasileiros(quadrinhos é para criança, é piadinhas, sátiras blá blá blá). Estamos com a ideia de fazer uma trama similar ao que o Japão nos vende: historias para reflexão, coisa mais densa, só que ilustrada!
De começo, pensamos em ser independentes, mas para tanto, só recorrendo as ferramentas digitais, pois os custos de produção impressa são absurdamente fora de alcance de um grupo de amadores iniciantes..
O que mais me preocupa ainda não é nem tanto o fato de algumas pessoas não saberem como lê, qual o publico alvo, etc. O que me deixa um pouco receoso é que, como em diversos outros setores, o brasileiro está acostumado a valorizar o de fora, sem nem dar chances aos seus artistas conterrâneos.
Mas um característica dividimos: sou otimista, e como nosso projeto é mais para prazer do que para Lucros(mas se o dinheiro vier, será bem vindo kkkkk), espero ver esse cenário mudar
Obrigado por dividir essa opinião conosco
Luís Fernando
Muito Além das Aspas
http://muitoalemdasaspas.blogspot.com.br/